Artigo: A Hora da Restauração

Artigo publicado no jornal O Globo, em 15 de junho de 2020

 

De Ricardo Piquet *

 

A história da Floresta Atlântica tem sido a história da degradação a ferro e fogo. Da cobertura originária só restaram 7% neste século. A pandemia provocada pelo novo coronavírus demonstra a inequívoca necessidade de nos reconectarmos ao planeta e modificamos essa histórica relação predatória com outras espécies – não há o “outro”, afinal, somos todos parte de um mesmo sistema, da mesma biodiversidade. Ainda dá tempo. Resiliência talvez seja o atributo fundamental dessa floresta. Segundo dados do Ministério do Meio Ambiente, a exuberante Mata Atlântica abriga 849 espécies de aves, 370 espécies de anfíbios, 200 espécies de répteis, 270 de mamíferos e cerca de 350 espécies de peixes. A quinta área mais rica em espécies endêmicas (que só ocorrem em um determinado local) do mundo. Cerca de 35% das espécies de vegetais brasileiras também dividem o bioma Atlântico com 120 milhões de Homo sapiens.

 

O Rio de Janeiro tem um compromisso histórico e deve capitanear as ações para recuperarmos áreas florestadas, gerarmos empregos e movermos, enfim, os moinhos de uma genuína economia verde – sem maquiagens. Tendo alcançado avanços significativos no combate ao desmatamento nos últimos anos, o território fluminense está salpicado de potentes totens: temos a maior floresta urbana do globo – o Parque Estadual da Pedra Branca, na Zona Oeste da capital –, abrigamos os micos-leões-dourados remanescentes, festejamos a primeira unidade de conservação destinada a proteger os manguezais da Baía da Guanabara: a APA de Guapi-Mirim, de 1984.

 

 

A pandemia provocada pelo novo coronavírus demonstra a inequívoca necessidade de nos reconectarmos ao planeta e modificamos essa histórica relação predatória com outras espécies

 

 

 

Aprovado na Secretaria estadual do Ambiente e Sustentabilidade (SEAS) no último dia 5 de junho, o projeto “Florestas do Amanhã” desponta como a grande chance para acelerarmos essa conexão com a mata prístina que molda a nossa existência. Com recursos estimados de R$ 79,5 milhões, provenientes de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) por conta dos impactos do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), o programa tem a ousada meta de recuperar 1.100 hectares até dezembro de 2021. Dezesseis municípios estão contemplados. Com os necessários acompanhamentos, somam-se cinco anos de projeto. Um novo paradigma incorporado à estratégia de segurança hídrica do Estado, mais do que urgente, em tempos de geosmina.

 

Como gestor operacional do Fundo da Mata Atlântica (FMA) desde maio de 2017, o Instituto de Desenvolvimento e Gestão (IDG) tem orgulho de ajudar a construir essa nova etapa de uma política maiúscula de Estado. Há três anos, estruturamos e administramos os recursos depositados nesse mecanismo pioneiro no Brasil e eficiente de gestão financeira e operacional de recursos privados. Contribuímos para uma execução ágil, transparente e planejada de projetos que se refletem na preservação da fauna, da flora e dos ecossistemas nativos.

 

Que esta oportunidade rara, com recursos financeiros e técnicos garantidos, com demandas urgentes e áreas disponíveis, não seja desperdiçada. Iniciativa que certamente dará a sua contribuição para mitigar os impactos econômicos nos municípios envolvidos, nestes momentos delicados e incertos pós pandemia.

 

* Ricardo Piquet é engenheiro civil, mestre em administração e diretor-presidente do IDG.